sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Não te deixo nada, oh morte

Por fim, eis que entrego os meus dias a ti
Não me deixo rico e nem pobre, apenas eu.
Não me perguntes e não me incomodes mais
Leve o que é teu e deixe o que é meu,
Restos do que fui.

Não vou lhe deixar a casa, o carro e o cachorro
Não lhe deixo também as flores, essas são minhas
Não levarás nada além deste corpo sóbrio e bem vestido.

Quiseras levar-me antes, doce ingenuidade.
Há tempo para todas as coisas, até para ti
Eu mesmo gostaria de dizer: não me roubastes a mim, mas eu deixei-me ir a ti
Sim, não sorrias de tal anedota.
Eu nasci
Eu vivi
E hoje eu morri.

Morte, hoje  meu sorriso estampado em tua cara, mostra que o que você leva, não o leva por ti
Levas por nós
Vives, morte, da vida alheia
Dos sonhos alheios
Em ti não  há vida nenhuma, apenas uma palidez profunda que o tempo te deixou.

Não lhe deixo meus textos, meus rascunhos, minhas  histórias
Deixo apenas a vontade de querer mais e mais
Da vida.
Então não posso temer-te, oh pálida e sem gosto.

Hoje resolvo viver enquanto tenho o que não podes ter e nem de outra forma poderias
Nasci,
Vivi,
Mas ainda não morri, vivo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Um texto um tanto quanto reflexivo e bem verdadeiro.
A morte vive da vida!
É temida por uns e desejada por outros.
Uns a desafia e outros fazem de tudo para não dar a menor chance a ela.
Uns a antecipam e outros a prolongam o máximo possível.
Enfim, vida e morte são faces da mesma moeda.

PS: vi esse documentário no Netflix https://www.netflix.com/title/81023023?s=i&trkid=13747225 e achei muito interessante, pois mostra o dia a dia de uma funerária e os rituais daquele povo, que são um tanto quanto diferentes dos nosso, mas, confesso, que gosto muito mais dos deles.