quinta-feira, 21 de junho de 2018

True Story - parte final

A vida sempre vem recheada de boas surpresas e eu sempre acreditei que pode haver uma surpresa boa ao final de cada picolé. O que acontece quem nem sempre eles veem premiados. 
A viajem estava ainda em bom e notório desafio. Tentei dormir e não consegui. Afinal havia duas britadeiras a todo vapor. Uma do meu lado e a outra na parte da frente.  Desta forma era quase impossível alguém dormir. 
Sabe quando vem aquela vontade terrível de fazer xixi? Você sabe e aposto que agora lembrou de alguma vez que veio esta vontade terrível de fazer um simples xixi e este simples xixi se torna num pesadelo sem fim. Pois bem deixa continuar a contar a true story mais um pouco.
Eu estava como vontade de fazer xixi. O cara do meu lado, o senhor Trua Storia, dormia e roncava num desenfreado sem fim. Eu fui segurando achando que a próxima parada não demoraria muito e isto foi a minha sina. Passou-se cinco minutos, dez minutos, vinte minutos e eu já não aguentava mais e fui obrigado a cutucar ele pedindo passagem, já que ele ocupava o seu assento Leito, parte do meu assento Leito e parte do corredor. Ele olhou para o meu lado com os olhos ainda cheio de sono e eu pedi passagem já levantando. Deixa te explicar uma coisa. Uma pessoa pequena, magrinha consegue somente virar um pouco das pernas de lado e  você já consegue passar. No caso deste meu companheiro de viajem não. Ele simplesmente é grande em todos os sentidos.  Teve que levantar. Ai que vem o desatino. Ônibus em movimento tudo é mais complicado. Ele foi levantando meio que em câmera lenta. Segurou no assento da frente, tomou força e foi. Não foi. Voltou e caiu sentado. Tentou pela segunda e somente na terceira que conseguiu pegar um arranque e ficou de pé. Neste momento eu passei e me dirigi para o banheiro. Aqui quero deixar registrado uma coisa: Banheiro de ônibus é a coisa mais engraçada do mundo. Uma porta minúscula, que abre e você no aperto não acha nem o apagador nem a tramela para trancar a bendita porta. Ainda tem uma saliência na frente que te obriga a ficar meio inclinado para fazer xixi. Sem falar que o cheiro é horrível e as pessoas que fazem o dois, nunca conseguem botar aquela coisa por água a baixo. Parece isopor.  Você dá descarga e ele roda, roda, finge que vai embora e quando o vazo faz aquele glogloglo glo ele ressurge mais vivo que nunca. Terrível.
Bom eu entrei e não achava a tramela e nem o apagador. A vontade de fazer xixi é sorrateira. Quando você está com vontade e começa a caminhar em direção ao banheiro ela dá uma trégua. Mas quando você chega perto do vazo ela te ataca com toda fúria e  o golpe te deixa zonzo que não consegue desabotoar o cinto. Pois é, entrei no banheiro e tomei o primeiro golpe. Não achava o apagador e fui obrigado a fechar a porta ainda no escuro. Achei a tramela e virei ela no sentido horário com  tudo escuro ainda e  eu apalpando e pensando porque cargas d'água eles não colocam de forma automática a luz. Eu não sabia se procurava o danado do apagador fujão ou soltava o cinto. Minha bexiga estava a ponto de explodir, quando tomei o segundo gole consegui com custo ascender a luz. Neste momento eu já tremia e o baixei o zíper e comecei a fazer o número um. Deixa explicar uma coisa para você que é mulher. Nós homens quando estamos com muita vontade de fazer xixi acontece algo hilário, simplesmente não conseguimos acertar o alvo com facilidade. Parece que o vazo fica a uns quinhentos metros de distância e o primeiro jato nunca, mas nunca mesmo sai em linha reta. Ele sempre faz uma curva  e para corrigir não há treinamento ético que dê jeito.  Agora imagina isto num banheiro minúsculo, com um teto que te obriga a ficar meio inclinado e com o ônibus em movimento. Não dá para esperar a curva acabar, para iniciar a jornada do xixi, isto  porque quando você mira e acha que vai acertar  e é neste momento, que diante de tanta reta que tem a estrada para Brasília que  o danado do ônibus faz uma curva e te prejudica no alcance do objetivo. E a gente não consegue fazer xixi no intermitente, só sai na rajada uma vez iniciado o processo, não dá para parar. Imagina na curva. Infelizmente tive que fazer  esta referencia para que as mulheres tenha piedade ao pedirem para acertar o alvo quando estivermos desesperados, com a bexiga explodido. 
Voltemos ao banheiro. Aliviei  de forma prazerosa. O alívio é indescritível. Mas  quando você abre a porta do banheiro todo mundo dá uma olhadinha para trás, talvez pensando que o fedor do banheiro é advindo de sua estadia lá. 
Bom depois do meu desafio no banheiro era hora de voltar para o assento Leito.  Caminhei de cabeça erguida diante dos poucos passageiros que não estavam dormindo. Para minha surpresa o Trua Storia estava acordado. Ele levantou e eu me sentei. A primeira coisa que ele me disse foi - Banheiro fedorento, né. Eu disse que sim.  Ao que ele respondeu: Eu só uso os da parada, é mais limpo e não balança muito. Tive que concordar. Dito isto o ônibus parou. 
Aproveitei para descer e tomar um café antes de retornarmos para a última leva da viagem.  Entrei na lanchonete e uma garçonete, nem sei se usa ainda este termo, veio e eu pedi um café com leite. Perguntei se poderia colocar um pouco de leite frio. Ela não respondeu. Sabe eu fico pensando que as pessoas deveriam gostar do que fazem, porque quando gostam, fazem melhor. A moça trouxe o café com leite frio. Eu sendo cortês e educado, disse que era só um pouco. A mulher me olhou e falou assim. O senhor disse para colocar leite frio e eu coloquei. Para não criar mais transtorno, afinal estava quase chegando ao meu destino, peguei o leite com café frio e tentei tomar, mas a mulher não parava de falar que ela tinha entendido certo. Deixei o café com leite no balcão para não deixar na cara dela, entrei no ônibus e logo em seguida veio o Trua e a Cheirinho de Barata juntamente com a menina sonolenta. 
O ônibus começou a sua marcha rumo à Brasília. Meia hora se passou e ouvi um chuarrrrr. Olhei para a frente e a menina tinha vomitado. Olha vou encurtar esta história de horrores.  Fui até Brasília com os pés levantados porque ora  aquela coisa  descia, ora ela subia trazendo aquele cheiro terrível. 
Chegamos em Brasília por volta das oito da manhã de um dia quente. Meu filho estava lá sorrindo e eu morto, depois de horas sofrendo. 
Ele perguntou: E ai velhinho como foi a viagem? Eu não tive nem ânimo de responder, só acenei a cabeça, entrei no carro e pensei: Volto de avião, volto de avião. 

Uma semana depois, estava em embarcando um voo Brasília - Belo Horizonte, livre do maldito "leito", longe de todo aquele sofrimento.  Entrei, sentei na poltrona, de forma tranquila. O ar condicionado ligado, Aeromoça linda. Quarenta minutos em BH. Tudo perfeito. Passageiros se acomodando nos seus lugares e sem essa de trocar de lugar com ninguém. Ai que maravilha. Foi só pensar e quem eu vejo embarcando o Trua Storia, mas esta é outra true story. 

Fim


quarta-feira, 20 de junho de 2018

True Story


Esta poderia ser uma daquelas histórias que escutamos no final de noite, quando não há mais nada a dizer. Poderia ser sim, mas não é. Esta é uma história. True Story.

E lá estava eu, sentado, quieto, aguardando o ônibus iniciar sua partida. Seria uma viajem de aproximadamente doze horas entre Belo Horizonte a Brasilia. Iria visitar meu filho, um lindo filho, diga-se de passagem, que mora naquela cidade seca, de grandes avenidas e muitos shoppings. Gosto mesmo são dos parques de lá, onde posso correr sem a preocupação de trombar com uma capivara ou uma nuvem preta de mosquitos, do qual eu já engoli um. Bom acho que era mosquito, mas isto é outra true story.  Como eu estava dizendo, estava sentado e entrou uma senhora gorda com uma criança. Ela veio em minha direção com aquele olhar de quem vai te pedir algo. Veio cadeira por cadeira. A cada cadeira que passava eu pensava: Senta aí, vai. A mulher passava pelos assentos e aproximava de mim. Eu numa agonia sem fim, afinal seria uma mulher gorda e uma criança durante doze horas de estrada. Ela com certeza iria abrir aqueles sacos de Doritos que tem cheiro de barata e com certeza iria esparramar aquilo para todo lado a viagem inteira.  Ela foi chegando e chegou. 
O ônibus era tipo leito. Aliás fica aqui registrado que eu não sei o que significa a palavra "leito" para os fabricantes de ônibus. Porque quando anunciam dizem LEITO e aí você pensa, nossa deve se uma cama king sizer hiper mega super plus macia e grande, com espaços para as pernas, braços, bunda e toda sorte de gordura que você por ventura tenha. Mas aí, quando você entra no bendito ônibus tem uma cama de solteiro, daquelas que usavam antigamente, uma de dobrar. Lembra? Então é assim o tal do leito. Não tem onde colocar os braços, as pernas. Com meia hora a bunda começa a queimar, as costas começam a ficar dormentes. A cabeça não tem sossego. Vira para um lado. Vira para o outro e o que acontece é uma dor terrível no pescoço. Mas afinal você comprou uma passagem Leito e se com Leito é assim, pensa sem leito. Meu Deus, melhor voltar para a mulher. 
Ela chegou perto de mim, com um olhar angelical, quase meio que Garfield. Parece que neste momento uma música toca nos ouvidos da gente e aí se perde o senso da razão. Ela disse: moço, o senhor se incomodaria de trocar de lugar com a minha filha. Ela está no banco de trás e eu neste. Eu, neste momento áureo de singeleza garfieldiana, imaginei que estava salvo de ser amarrotado por doze horas no espaço do meu "confortável” Leito. Claro que sim, respondi. 
Olha, confesso que ajudei a colocar a bagagem de mão naquele lugar acima do assento. E por falar em bagagem de mão. O que é uma bagagem de mão? Com a nova ordem de economia das empresas de transportes a bagagem de mão foi diminuindo, diminuindo e hoje é bagagem de uma mão. Vou explicar: tudo que você puder carregar com uma mão só e couber numa maleta, é uma bagagem de uma mão. Assim sua bagagem de mão só cabe coisas supérfluas. Pois bem, eu troquei de lugar com a mulher e fui para o assento de trás. Bom para todos, iniciamos a viagem. 
Estava eu dormindo quando senti o ônibus parar. Olhei tentando identificar o local onde estávamos. Aproveitei para sondar o banco da frente e confirmar que eu havia me dado bem, pois o assento do meu lado estava vazio. Era eu e o meu assento Leito e do lado outro assento Leito. Maravilha. Olhei para o banco da frente e a mulher estava mastigando aquele salgadinho com cheiro de barata. Confesso que esbocei um sorriso de satisfação. 
Alegria de pobre dura pouco e descobri isto quando olhei e veio um cara gigantesco. Imediatamente olhei para ver se havia outro assento vazio além do meu. Não havia. Ele veio e sentou como se tivesse afundado a poltrona no chão. Cumprimentou-me com educação e uma voz fina, meio que pigarreada. Ele tinha um cheiro fétido de enxofre. Acho que devido ao suor de dias, meses, anos, décadas impregnado nas roupas. Saudade me deu do cheiro da barata.
Bom bora lá terminar a primeira parte desta true story.
A primeira coisa que ele fez, adivinha? Ele enfiou a mão num bolsa e tirou um saco de supermercado cheio de pipocas, destas feitas em casa que fica um terço de piruás no fundo. Começou a mastigar aquilo num "cruenk, cruenk". Mastiga de um lado da boca, depois joga para o outro lado e chuta no meio da goela. 
Eu meio sem jeito virei para o canto da janela, pois o ônibus estava já em movimento e ele disse assim: 
- Você sabe o que significa "trua istória"?  Disse isto com a boca cheia de pipoca mastigada. Disse que não. E ele insistiu: você não sabe?  "trua istória" é quando você assiste um "filmi" que é a "istória" é verdade. 
Agora pensa comigo. Como iria corrigir um estranho. Como não teve outro jeito, tive que fazer aquela correção imperceptível - ah sim! True Story. Claro que sei. Para que eu disse isto. O cara começou a contar o filme que ele tinha assistido, e com detalhes. Agora imagina eu, sentado no canto de um assento Leito com um cara que a bunda ultrapassava o assento. De um lado me espremia, do outro ocupava metade do corredor. Para potencializar minha desaventurança, havia o cheiro de barata do salgadinho que a mulher do banco da frente comia, juntado a isto, o cheiro de enxofre do cara do meu lado. Aliado ao meu infortúnio   o "cruenk, cruenk" das mordidas da pipoca. E ele ainda contava a sua "trua istória" com a boca cheia de piruá quebrado. 
Viajem seguiu e ele não parava de fala. Acho que o filme tinha dez temporadas, não era possível. Neste momento as pipocas haviam acabado e eu me alegrava porque nem cheiro de barata e som de pipoca havia. Por fim, depois de umas duas horas ou mais ele terminou o filme repetindo que era uma "trua istória”.
Houve um silêncio, pois já era umas duas da manhã e o que se ouvia era apenas o ronco do motor e o frisar dos pneus no asfalto. Dormi.
Rooookkkk, hruuummmm. Estes sons vieram aos meus ouvidos como uma bomba atômica. Acordei assustado. O meu companheiro de viajem estava esparramado no pequeno assento Leito. Barriga para o teto, boca aberta e um sofregar respiratório que nunca vi na vida. Mas o incrível que ao inspirar ele fazia hrummmm e ao expirar Roooook. Mas neste meio tempo entre o descanso de uma expiração e inspiração ouvia-se outro som como de um carro com motor a diesel. Olhei, para o Trua Istória e percebi que não era ele. Quando levantei um pouco vi a Cheirinho de Barata sentada e com o corpo tombado para a janela. Ela roncava com tanta força que acho que o vidro tremia. 
Eu estava encolhido num cantinho do assento Leito e estiquei o braço para tentar pegar o celular no bolso da frente da calça. Era tanto aperto que não conseguia me mexer direito. Fui empurrando o celular bolso acima, porque não dava para enfiar a mão para apanhá-lo. Pronto, depois de muito esforço e suor, consegui pegar o celular. Horas? Quatro e quinze. Ainda faltava muito chão para chegar em Brasilia e sobrava sofrimento daqueles dois. Trua Stória e Cheirinho de Barata não dava tréguas.

Continua….


terça-feira, 19 de junho de 2018

Sou o Amor

Quero apenas ser noite, sem me preocupar se será enluarada ou não. Será que a beleza está na lua ou na noite? A lua é o tela ou a moldura?
Quero penas ser o dia, sem me preocupar se vai ser ensolarado ou não. Será  que a beleza está no sol ou no dia? O sol é a tela ou moldura?
Caso haja chuva, caso haja sol, lua... enquanto houver vida, enquanto houver vida.  Vou estar lá
Eu quero ser apenas ser... Vivo 
Eu quero ser apenas ser... visto
Eu quero ser apenas ser... sentido

Sou flor que foi dada a amada
Sou lábio que beijos receberam
Sou o braço que foi dado 
Sou a água que percorreu o seu corpo
Sou a palavra amada 
Sou  a noite, o dia, o sol e a lua.
Sou o verso de despedida, de chegada e de partida
Sou a declaração no altar da vida
Sou o que te faz sorri e chorar
Sou o que te faz sentir-se vivo
Sou o Amor. 

O Belo da beleza escondida no rodar da saia na beira da roda
E pula a corda, pula dia, pula tempo

Amor que habita o simples 
Amor que habita o culto
Amor que é belo sem luar
Amor que é simples com todos os astros

Amor de música eu sou 

Quero ser complexo enquanto eu for simples ... amor 
Quero ser dialético em seu viver
Um contraponto 
Um contra senso
Um amor essencialmente puro  
Um amor essencialmente simples

Quero ser apenas noite. A lua, a lua é apenas um detalhe, porque existe noite sem lua e ainda assim a noite pode ser bela, mas se houver lua sem noite a lua está sozinha. 
Assim é o amor.