segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Contos de um dia Calmo - Parte 4- Ana

    Os pássaros já cantavam sobre as árvores próxima a janela do meu quarto, no segundo andar do prédio onde me hospedo. O sabiá com seu canto estrondoso e lindo catava fortemente anunciando o dia. Havia bem-te-vis, canário, pardais e um monte  de outros pássaros fazendo seu café da manhã na maior algazarra. 
Abri os olhos e olhei da cama a janela. O sol estava nascendo com o seu amarelo âmbar de dar gosto. Aquele seria mais um dia  de sol. Domingo de sol em dias calmos na cidade. O único movimento que se pode notar é o da missa. Fieis caminham em direção a matriz no final da rua onde moro e rezam a manhã inteira. Todos os domingos é a mesma coisa, a mesma calmaria de sempre. Pássaros, pessoas e missa.
Levantei e fui em direção à janela para observar as pessoas na rua. Olhei meio sonolento ainda, mulheres subiam a rua com suas saias grandes e seus chales pretos que cobriam a cabeça, acho que para dar importância à cerimônia ou quem sabe para esconder-se dos olhares. O dia estava calmo. Domingo calmo para todas as pessoas e calmaria no mundo. 
Meus olhos ainda pesados da noite mal dormida, depararam com ela subindo a rua em companhia de outras mulheres. 

                               Coração bate mais rápido 
                               As pupilas dilatam e os olhos mais abertos ficam,          
                               Falta  ar
                               O suor aparece.
                               Adrenalina, descarregada no corpo e na alma dos que amam.

Vesti-me o mais rápido possível, desci as escadas atropelando os degraus e cheguei a rua, mas ela já havia sumido. Talvez entrara  na igreja, pensei. Caminhei entrei e varri o ambiente com os olhos para encontrá-la

                              O amor procura o amor 
                              Percorre, na calada da noite, corações sozinhos e disponíveis
                              Marcam-se encontros ás escondidas
                             Entrelaçam olhares, vontades e corpos...


Ela estava sentada num canto da igreja, perto da janela, entre os pilares enormes e redondos  que iam do chão ao teto. Eram revestidos de mármore rosa lindíssimo. Caminhei, dando a volta por traz dos fieis que fixavam seus olhares no altar onde o padre falava algo. Caminhei e  estava do lado dela. Sentei-me ao com um pedido de licença engasgado para sair.

Olha que dia calmo meu amor
Quando te vi, eu estava certo 
Segurei-me para não perder o jeito 
Jeito de quem está sem jeito.

A missa já havia terminado, quando percebi que ela estava em pé do meu lado. Levantei-me para permitir ela passar, mas quando dei por mim estava olhando-a fitadamente nos olhos. 
- Desculpe, disse meio sem jeito. 
- Está tudo bem - ela respondeu caminhando para sair do meio do banco da igreja. 
- Permita-me, qual o seu nome - perguntei com ar de ser reprovado pelo atrevimento. Naqueles tempos calmos, outros tempos, um flerte era mais valorizado que os tempos tempestuosos de hoje. Ela respondeu-me - Ana.
- Permita-me que  a acompanhe - arrisquei dizer
- Sim , claro - foi a resposta branda e delicada.

O que fazer quando se é invadido pela vontade 
Vontade de saber dos lábios de outra pessoa
Vontade de tocar na mão de outra pessoa
Vontade da vontade que não passa, pela outra pessoa.

Caminhamos pela igreja até a saída e ela sempre ali linda e cheirosa. Aquele cheiro morava dentro de mim, das lembranças do dia Calmo que a vi.
Descemos a rua e  ela me indagou.

-  O senhor não disse seu nome?
- Ah sim, perdoe-me - respondi meio sem perceber - meu nome é Antônio 
- O senhor não é daqui - ela continuou 
- Não, eu estou na cidade apenas alguns dias, vim para fazer um trabalho. Sou escritor.
- O senhor é escritor? ela perguntou com um ar de surpresa e meio assustada.
- Sim eu sou, mas ainda não publiquei nenhum livro, então me mantenho dando aulas.
- E sobre o que escreve? 
 Existe perguntas que simplesmente aterroriza o ser humano, perguntas que você não está preparado para responder. 
- Eu , bom... eu escrevo sobre a vida, o amor, as pessoas - Esta foi a responta mais imbecil que pude dar. 
Na verdade eu não tinha nada em mente para escrever, e lembro-me, de forma ainda viva em meus pensamentos, que nem sabia se eu era realmente um escritor. 
Descemos a rua e no final da rua, de frente a uma casa enorme, com um jardim cheio de margaridas plantadas, todas juntinhas ela parou e abriu o portão de grades brancas.
- Obrigado senhor Antônio pela companhia.
- Não há de quê,  preciso conhecer pessoa e lugares na cidade e você foi a primeira. 
- Que bom que foi a primeira. - ela respondeu fechando o portão e entrando na casa.

O amor podia ser simples como é simples sofrer de amor
Para sofrer não precisa de força, nem de incentivo. Sofremos.
O amor é complicado, quando se está amando 
Tira a razão e coloca a emoção. 
A cabeça ama e o coração padece. 
A cabeça que pensava, agora, inebriada, tende a amar. 
E o coração que deveria amar, agora sofre.


Um dia Calmo eu conheci Ana. 
Um dia Calmo eu conheci a mulher que fez meu coração acelerar. 
Por onde anda Ana  nestes anos calmos que hoje  hoje vivo.






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